OUTRAS PRECIOSIDADES (217)
A SERIEDADE É UMA DOENÇA
A seriedade é uma doença e o mais
sério dos animais é o burro, ninguém
lhe tira, nem com afagos, nem com a
chibata, aquele semblante cabido de
mágoas recônditas que o ralam no seu
peito. Há nele a linha, o perfil do
sábio refugado no concurso ao magistério,
do candidato à câmara baixa bigodeado
pela perfídia de eleitores que, saturados
de genebra e carta constitucional, desde
a taberna até a urna, fermentaram a
crisálida de consciências novas. O burro
é assim, triste por fora, mas é feliz por
dentro, e riria dos seus homônimos se
pudesse igualá-los na faculdade de rir,
que é exclusiva do homem e da hiena,
a qual ri com umas exultações ferozes tão
autênticas como as lágrimas insidiosas
do crocodilo.