Apenas um capítulo

Começamos tão certo. Sem forçar em nada o destino, sem apressá-lo. Nossa simpatia um para com o outro foi verdadeira antes mesmo de sabermos nossos nomes. Nossos olhares se cruzavam e o sorriso era sincero, puro. O destino, paciente, ainda estava escolhendo as cores que usaria para trançar nossas vidas. Éramos dois desconhecidos, felizes ao se esbarrarem. Sabíamos que não fazíamos parte do mesmo livro, mas sequer imaginávamos que viríamos a escrever um capítulo juntos. Nossos olhares começaram a semear curiosidade, despretensiosa, até que nossas conversas fluíram muito melhor do que qualquer um poderia haver planejado. Nossa sintonia fez o resto do mundo perder prioridade, fez o tempo perder o ritmo. Quando estávamos juntos, as horas simplesmente voavam e esquecíamos que a vida tinha seus compromissos. Distantes, os minutos se arrastavam, sem sabermos se voltaríamos a nos ver. Passamos a sobreviver de surpresas agradáveis, o melhor sorriso do dia era ao te ver. E, ainda assim, mal nos conhecíamos. Deixamos a cargo da imaginação alimentar essa história. Mas as partes mais surreais foram aquelas que pudemos de fato viver. Essas, sim, eram inacreditáveis. Começamos tão certo, e queria poder dizer - ainda que triste - que terminamos tão errado, que para nós não deveria ter havido fim. Mas nós nunca forçamos em nada o destino, nunca nos pusemos a apressá-lo. Nossa simpatia um para com o outro perdurou mesmo depois de conhecermos nossos nomes, mesmo quando descobrimos que deles teríamos que nos esquecer. E assim, dói-me mais dizer que terminamos também tão certo, sem que nossos olhares pudessem voltar a se cruzar. Depois de tanto tempo cuidadosamente escolhendo a lâmina, o destino desfez nosso enlace delicadamente. E voltamos a ser dois desconhecidos, cujo capítulo partilhado havia chegado ao fim.

Dancker
Enviado por Dancker em 28/07/2020
Reeditado em 14/09/2020
Código do texto: T7018879
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