Septuagésimo quinto dia.

"A quarentena de um poeta"

Septuagésimo quinto dia:

O meu Rio de Janeiro ultrapassara a China no número de óbitos a não se ter a perspectiva da descida da curva. Fizera oitenta e cinco dias de quarentena e não se conhecera ainda uma solução para que o mal fosse afastado definitivamente da nossa região carente de recursos humanos.

A tristeza invadira o meu âmago a me deixar vulnerável as ações do inimigo, porém Maria levantara o meu astral a me convencer que eu deveria continuar a acreditar no nosso amor, um presente de Deus que nos prometera abundância. Eu precisara comprar meus remédios e estacionara meu automóvel frente à farmácia a observar as pessoas circularem no centro da pequena cidade. Um jovem desmascarado e embaçado que sentava sobre um latão de tinta a aguardar o seu transporte coletivo não parava de me encarar. Ele poderia estar a me confundir com alguém ou seria um sinal epifânio da minha mudança de rumo.

O mundo não parara para aquele trabalhador informal que tinha suas narinas entupidas de partículas de massa corrida. A sua mão direita segurava uma espátula de guerreiro em seu traje de gladiador. A necessidade de se expor ao inimigo era um perigo maior que o meu que pertencera ao grupo de risco.

O seu olhar em minha direção não se desviara, era como uma mensagem a ser decifrada. Eu não tinha coragem de pisar no asfalto, não soltara nem mesmo o cinto de segurança e o pisca alerta representava o meu silêncio.

Não dava para disfarçar o meu medo, pois eu girava meia circunferência a mirar o movimento a ver outras cenas, todavia, a imagem do garoto congelara e eu retornava a fixar com mais clareza o retrato do rapaz que me abandonara a subir no degrau do ônibus a me cumprimentar com o balançar de sua cabeça.

Maria Alice sentara ao meu lado e imediatamente houvera uma peripécia. O medo fora embora e a coragem brotara. Eu passara a crer no amanhã cheio de esperança e quando o mal abrisse uma brecha, eu lançaria gotas de amor e ternura tal qual as que recebera naquela tarde de raios frios do sol que estava a partir.

Epifania

Durante a guerra há peões

Há o berro em silêncio

No olhar dos anfitriões da terra

E peripécias da arte

Os postes se mantêm presos

A ancorar os fortes

Que encaram a morte

E os preconceitos

A fome é ambígua

A matar ou dela morrer

É a razão do ato de bravura

E dos olhares de ternura

Há estranhos no ninho de pedra

Que revelam a epifania

A deixar claro o destino

E os novos dias

Ed Ramos
Enviado por Ed Ramos em 29/05/2020
Reeditado em 29/05/2020
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