Trigésimo primeiro dia
"A quarentena de um poeta"
Trigésimo primeiro dia:
Acordei a pensar somente em números. Como explicar para algumas pessoas que aquilo que estava a nos aniquilar era tão pujante? Um prepotente líder fora atingido e estava aparentemente fora de perigo. O inimigo astuciosamente tentara atingir fatalmente o palácio para desestabilizar um processo que razoavelmente estava de acordo com as normas de saúde.
O sarcasmo e a desdenha dos Bocas do Inferno era impiedoso e mesmo os que não tinham o privilégio de um bom plano de saúde lançavam nas redes sociais ataques de ironias e continuavam escondidos em suas malocas sem a coragem de encarar um adversário "tão frágil" e possuiam um arsenal de metralhadoras que disparavam projéteis virtuais aleatoriamente nos irmãos da própria comunidade que discordavam que a vida era prioridade.
Há exatamente um mês eu chorara diante do nada a dizer que havia duzentos e trinta casos de infectados no Brasil enquanto que na China eram três mil e duzentos e desessete mortos. Uma pequena sociedade alheia não acreditara que em tão pouco tempo o número subiria em nosso país para mil e trezentas mortes e vinte cinco mil casos o que desbancaria a matemática dos que afirmaram que a dengue matara muito mais brasileiros, discurso dos que menosprezam o homicida. Somente em um mês houve mais morte de covid19 que o ano anterior inteiro de dengue e o fato real era que o crescimento da tragédia era exponencial e ligeiro, a ser uma conta previsível.
Eu nunca soubera que em surtos da doença febril aguda houvesse tantas mortes de profissionais da saúde como nessa batalha, o que me fazia entender que a moléstia danada era atrevida.
Havia o medo de dois colapsos, o primeiro aconteceria caso não houvesse a inteligência dos superiores a manter o isolamento que atrasaria o avanço da praga o que daria tempo de preparar os leitos dos golpeados e o segundo estaria consumado, porém a economia era um assunto primado.
Assustara-me muito com as valas de Nova York, os caixões nas igrejas de Lombardia, os cadáveres mascarados da Irlanda, a não purificação dos mortos do Irã, o funeral realizado na Espanha e os descomedidos do Brasil.
"Pela fresta sinto o amargo
De assistir ao alvoroço
A algazarra dos moços
Que circulam pelo ar"