Vigésimo sexto dia

"A quarentena de um poeta"

Vigésimo sexto dia:

Até o mar fizera seu papel a nos defender, jogara fortemente suas ondas sobres os teimosos da calçada naquela manhã de resultados assustadores.

Estava bem claro que no vigésimo sexto dia o salva-vidas se chamava "Isolamento Social", todavia a nossa despensa estava vazia e Maria e Aline se aventuraram ir para um hipermercado fazer compras. Totalmente equipadadas de seus armamentos contra o antagonista, elas se caracterizavam totalmente opostas ao seu normal cotidiano. Trocaram suas unhas pintadas, seus chemises e saltos por luvas, calças compridas, blusas cacharrel e botas de couro e tinham a cobrir seus rostos máscaras de panos estampados e óculos a liberar somente os seus cabelos.

Ao chegarem no grande estabelecimento tiveram dificuldade para estacionar, o que as fez imaginarem o quanto estaria aglomerado ao redor das gôndolas que ofereciam produtos de atacadão a preços flexíveis.

As pessoas trafegavam com seus carrinhos entre os paleteiros que abasteciam as estantes e um espirro gritante de repente assustara os compradores que se jogavam no piso acinzentado do mercado como se fosse um tiro de uma bala perdida.

Alice observara o espanto dos consumidores que obedeciam as normas técnicas da Organização Mundial da Saúde ao irem de encontro na pequena aglomeração no caixa que distorciam de seus trajes a utilizar o mínimo de roupa com seus membros e rostos descobertos, lugar perfeito para o vírus se alojar.

Em casa, eu me cuidava, porém estava preocupado com os excessos de gotículas daquele mercado de peixes que o vídeo me mostrara e o associei à origem do mal.

Enfim, chegara a dupla dinâmica a ordenar que fosse retirado os produtos da mala do automóvel e correra para o banho imediatamente, pois havia na entrada do banheiro dois sacos plástico a esperar as suas vestes. Asaph não entendera nada e se jogara no meio do box a chuviscar a mulherada, sua avó e sua mãe, com a mangueira do chuveiro a gritar de felicidade.

Eu a cada viagem ouvira a algazarra dos três e refletira que o dia fora maravilhoso para eles. Elas, pelo pouco de liberdade e ele pela ventura de vê-las novamente. Era preciso aproveitar cada instante daquele hoje:

E se não houver o amanhã?

Não apresses o amanhã

Viva o hoje tão descomedidamente

Para que o ontem deixe saudades

Da quantidade de prazer

Tolere os alaridos da madrugada

Para que o som do começar do dia

Seja o de uma sinfonia de amor

A vir dos bichos de seda

Não retenha o suor da vontade

Conceda seus braços

Desabroche as flores

Com o calor de seus abraços

Viva com veemência a cada instante ...

Ed Ramos
Enviado por Ed Ramos em 11/04/2020
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