Espinho signo
Ainda estamos aqui, dentro desta criatura. Podemos ouvir o rugido do lado de fora. Na ausência de som, escutamos o ritmo descompassado e estrondoso do seu coração pulsando sangue e palavra.
Queríamos dormir, mas o milagre se manifestou em nossos sonhos, neste vácuo tumultuado falou conosco com sua voz incrédula. Deitamos exauridos nos braços abertos da senhora flagelada, mas o sagrado apareceu novamente nos levando ao transe desmistificado.
Cada vez mais tangível, transpassando nossa carcaça em decomposição, onde as moscas pairam aguardando o findar que é o destino inescapável. Nosso inconsciente oscilava como um castiçal fumegante, exalando o cheiro das cinzas de outras épocas literárias.
Então despertamos, contudo, não éramos os mesmos. Prisioneiros de grilhões invisíveis, enraizados em um corpo familiar, porém desconhecido. Sem expiação, saco de ossos imersos no caldo em fervura da raiva.
Recordando o que é existir pela dor, despertando em um corpo adormecido pela maldição da puerilidade. Vendo secar os espinhos retorcidos e interditos, acalentados por sua incapacidade de perfurar nossa carne.
Daniel César - Natal, 05/02/2020.