Ribeira dos loucos
Na rua, um agente secreto do exército me abordou perguntando - “você tem identificação?” Como num reflexo, devolvi-lhe a pergunta - “qual sua identificação?” Ele rispidamente respondeu - “sou secreto, não tenho identidade”. Fiquei indignado com a situação, mas como quem quer se livrar abri a bolsa. Ele me mirou nos olhos e disse - “é melhor você ir embora da festa!” Segundo ele, tinham oito caras disfarçados para me prender.
Resolvi não sair, ele foi embora. Entendi que era só um lunático e fui atrás dele. Todo meu corpo era movido somente por um objetivo: quebrar seus dentes e lhe fazer engolir os farelos. No beco estreito, o louco desapareceu. Amorteci minha fúria no álcool, comi salgadinhos com refrigerante vagabundo. Andando pela praça, um cidadão me pede um cigarro, usava óculos pretos e cordão prateado. Ele me confessou de forma estranha - “faço ciência”. Curiosamente questionei - “qual sua invenção?” Ele respondeu - “tatuagens de vidro”. Não entendi muito bem, segui meu caminho.
Inesperadamente, ouvi de cima de uma árvore um ateu dizer que Deus inventou o picolé. Em seguida, outro insensato virou e me fez um pedido - “moço me dá um diamante?” Estava abismado, meus pés não me obedeciam. Dias sem nexo, verdadeiro carnaval de desenganos. Você encontra figuras perambulantes, desvairadas, criando sonhos e vivendo fantasias, submundo colorido de desrazão e caos.
Uma coisa é certa, quem olha o banco ao lado tropeça. Me deparei com isso hoje, entretanto, contive minha risada. Nos rios da vida, desencontramos coisas risíveis e se possível damos gargalhadas. O sol é totalitário, diferentemente da lua democrática. o primeiro não permite ser desafiado com os olhos; a outra fascina os amantes desde tempos imemoriais. Desejo continuar andando nesta cidade, cuspindo na lápide dos meus ancestrais.
A história é velha, desgastada, vamos viver mundos alhures onde tudo se dissolva em cores. Um universo de gravidade única, desmedido, no qual a imaginação se perde no infinito e penso sorrido - “tudo isso é maravilhosamente lindo”.
Daniel César. Natal, 2015.