Quisera

Quisera eu nunca te ferir, nunca errar, nunca me desencontrar de ti... mas como seria isso possível? Se em mim mesma feridas latejam ao anúncio da tua repentina chegada, se o certo e o errado esqueceram-se de avisar-nos de seus limites, se ando ainda a caminho de encontrar-me comigo... Como seria possível?

Quisera eu que somente a leveza sustentasse nossos tão esperados e breves momentos... e que esses momentos parassem o tempo pra eu não ter que dizer "boa noite, dorme bem, tenha bons sonhos"... quisera eu que não precisasse haver sonhos... Mas seria isso possível? Se arrastamos pelos calcanhares pesos os mais diversos, se a lógica das horas é lentidão na ausência e fugacidade na presença, e se de sonhos acostumei-me a alimentar-me... Talvez não fosse mesmo possível, não ainda!

No entanto, há feridas para que se aprenda o cuidado, erros para que se exerça o aprimoramento, desencontros para que se abram novos caminhos. A leveza que se turvou dissipa a ilusão para mostrar que há no real beleza a ser lapidada, beleza essa que flui com as horas, lentas ou fugazes, numa dança de múltiplos compassos. E se ainda assim há sonhos... que eles possam durar o bastante para alcançarem a luz do dia!