CASA PLANTADA
                       
Nem a primeira nem a última, eram muitas casas. Aquela de  tijolos, da esquina  talvez fosse. Decemos e subimos suas escadarias escuras e íngremes, ela fazia  frente para uma avenida movimentada, quem sabe  aquela. 

Aquela casa  ao primeiro tempo rescendia abissais sensações. Mas,  se fosse ela o lugar, o estado, o continente, o oceano donde  o pequeno lago ilhado fosse  o patamar donde se pudesse alvejar a escuridão, quem sabe toda pintada, com florestas  nas  janelas...

Assim  aconteceria ,  não haveria mais marcas  surradas ,impossíveis  de tantos pés  nas paredes pintadas a óleo  do quarto marcando as tábuas em madeira de lei, e os sonhos  quase caindo da beira da cama, dos travesseiros alvos, cheirosos, simples cretones brancos, aos abismos  onde só as baratas conhecem...

agora , porém,  não se conseguia sair de dentro daquela casa acinzentada,  mesmo de escadas funéreas e indagações  tão  estranhas.

Uma casa é  a extensão do próprio corpo, tem paredes mortais, ela respira junto, carregamo-la às costas, ao nariz, nas amendoas dos olhos, no chafariz das lágrimas...

Ela ouvia ruídos sobre a compra.  Será que ele gostaria dela ? Era sóbria, ele não podia falhar agora de novo, a gente  mudaria  já para lá, limparíamos seus comodos, removeríamos  as teias de aranhas, espantaríamos os morcegos,  pintaríamos ela  na  cor bege, e ela ficaria maravilhosa  , com cortinas longas nas janelas, tapetes rústicos....

....e uma casa de tijolos é uma casa  de barro ancestral, com veias geológicas, genealogias epistemológicas, com ruídos de objetos inominados, árvore abissal nascida de ventres dolorosos,  árvore de barro  difícil de se conseguir transplantar do primeiro lugar desde o primeiro dilúvio, uma planta...

Muitas plantas naquela varanda interna ela geraria , não poderia faltar as  begonias...é, mas, ela ficava há um patamar   abaixo da rua...não importava isso, essa topografia daria a ela olhos e perspectivas de baixo para cima, poderia melhor ver a altura das pessoas e contar as estrelas, separa-las dos néons...

mas, a localização dela era tangengial, uma esquina, bom,  caminho do meio,  tangente,  fiel da consciência, isso a valorizava  ainda mais, acho que ele iria gostar  dela e finalmente íriamos ter aquele canto que tanto queríamos. As venezianas das janelas eram sólidas,  abririam e fechariam   cada noite e  cada dia e  com porão  de alguma claridade....