O silêncio poeirento das coisas esquecidas
Tudo quanto tenho pensado e, por consequência, vivido, não é mais nem menos real que as abstrações dos meus sonhos loucos. Todo o meu dia transcorre numa interseção de monólogos, diálogos, respostas rápidas e inteligentes, imaginações sonhadas a luz do dia.
É noite funda e o sono não vêm, tenho sono mas não consigo dormir. Escrevo para entreter-me do tédio de nada querer fazer, para fugir ao cansaço que me causa ver a poeira esquecida por sobre os livros, lembrando-me que ainda não li e nem lerei, pois tem me faltado vontade para os ler. Tenho lido somente meus personagens que me trajo enquanto imagino que estou vivendo.
Penso e sinto numa monotonia de um bocejo; distante o bastante para não ver-me e escrever sobre o que não vejo e nem sei. Apenas imagino que seja. Assim posso esquecer-me do tédio de viver.
Há um silêncio espiritual por dentro e fora de mim, por entre e cima dos telhados, nas valas escuras e ruas esburacadas. Sinto-o e não o quero sentir. É como um tédio de Deus por tudo, sobre céu que se derrama por terra e corações de homens. Lá fora a noite é soturna, silenciosa, imaterial como o silêncio que não se ouve nem vê, e por sobre tudo paira o mesmo silêncio esquecido das coisas cotidianas, a mesma sensação física dos olhos lânguidos do mais do mesmo que o marido encosta sobre a imagem de sua esposa.
Quero dormir, mas não tenho sono. E por isso durmo nestas palavras meu próprio ser cansado de sonhar. Vou sonhando-me aqui mesmo esquecido do dia que já foi enquanto o sono tarda a chegar, espero a vida vir dormir-me para poder descansar, ou talvez sonhar novamente...