TECENDO O LUSCO-FUSCO OU JARDIM DO PUXA
Para João Cabral de Melo Neto
1 
 
Uma cigarra sozinha não tece um lusco-fusco:
ela precisará sempre de outras cigarras.
De uma que apanhe esse canto que ela
e o lance a outra; de uma outra cigarra
que apanhe o canto de uma cigarra antes
e o lance a outra; e de outras cigarras
que com muitas outras cigarras se cruzem
os fios de tarde azulada de seus cantos de cigarras
para que o lusco-fusco, desde a sua teia tênue
se vá tecendo entre todas as cigarras.
2
 
E se encorpando em tela, entre todas,
se erguendo tenda, onde entrem todos,
se entretendo para todos, no toldo
(o entardecer), toldo de um tecido tão ígneo
que tecido se crepuscula por si: Luz bolão.