A MORTE DA FOLHA

Um dia, pergaminho divino quero ser. É o último alento para um templo em ruínas. Se hoje ressôo toadas e correm-me versos, é por somente nobreza de um ser de gentil afeito, que uma vez me olhou e pôde me ver. Agora, poucos vêem... Quase não olham. Sou tão simples, tão pequeno que quase não existo. Por sorte, quase não existir é ter também o dom da singularidade. E assim, sendo único, serei importante a minha maneira. Agora, mais que antes, pouco importa quem não se importa comigo. Pouco vale o mundo em que vivo e não me olham!

Para ínfimos seres como eu, vida é uma grande metáfora, jamais um paradoxo!

Pois um dia "vivi"... Fui verde como os olhos que por mim já se encantaram. Inspirei paixões, fui amado, poetizado. E são, agora, reminiscências da arte natural que representei.

Hoje não sirvo para o mundo. Sou um continente exilado. E os que olham além da ilha, em nada miram além de brumas. A própria natureza se acanha de mim.

Assim floresce, ao passo que seca, a grande metáfora de minha existência: De um império majestoso que é a vida, ser a ruína do templo aos pés da colina, e não ir além.

E ser assim até o dia em que não há mais história, metáfora ou paradoxo. Tampouco palavras que contem o fim deste ínfimo ser, que hoje, assim, deixa de ser:

Em palavras turvas e mal escritas, falando de tão pouco que é quase nada. E nada mais pode ser. São palavras escritas em mim. E de mim somente falam. E unicamente hoje dirão.

E será um canto que celebre a volta deste corpo às cinzas. Volvendo a matéria à sua origem estelar.

Pois, nesse instante, se consome em chamas esse baldado papel amassado!

LANÇAROTT