A caixa ....[ lágrimas de poesia]
Todo homem tem uma caixa guardada dentro de si. Diz a lenda que a "vigia" deste tesouro milenar e inexplorado chama-se Pandora, e que tudo fica tão guardado porque os sentimentos nebulosos dos homens podem provocar todas as mazelas do mundo, dependendo de quem usa.
Pois bem, as coisas se [re]desconfiguram, muito fácil. E o poeta sabia disso.. naquela noite de sábado.
O poeta mexeu em todos os peaços desconexos que havia dentro de si. Limpou todas as áreas, guardou o que não gostaria que todos vissem. O poeta verteu todas as lágrimas acumuladas, como se ninguém ouvisse. Mas ela estava perto....
A menina ouviu o pranto sincero e procurou medir a sua presença... Por certo que não queria fazer barulho demais e atrapalhar o pranto... Até porque as lágrimas são sempre bonitas.. moldadas.. reflexivas. Elas lavam os rostos condenados pela dúvida. E lágrimas de poeta não podem ser medidas, exceto em poesia.
Entre eles, um abismo. O abismo do silêncio, o mesmo que os fazia se observarem mutuamente, até com certa euforia. O silêncio dos mudos que dizem muita coisa guardada, com os olhos, apenas.
A menina apossou-se do rosto dele, acanhada. Tratou de buscar as feridas que doíam tanto. Mas ele apenas apontou o peito, e fez com que ela apontasse exatamente o lugar da chaga doída. Ela lhe deu um abraço enorme, daqueles de ficar grudado. Mais lágrimas. E ela entendeu que deveria ficar em silêncio, mas não quis.
A menina evocou os males daquela chaga. Na sua inocência aparente não quis jogar mais brasa no buraco, apenas quis saber pra que rumo ia o fogo. Mas as labaredas se espalharam tanto que lhe acertaram o rosto frágil. As labaredas doíam, mas muito menos que as dores do poeta. E ela descobriu, num momento ímpar, que ver a dor do outro pode doer muito, se o outro é um querido especial.
...E sem silêncio algum saiu perguntando, indagando, repetindo e dizendo tudo o mais que lhe podia vir na cabeça, naquela hora. Mas não maldisse ou praguejou sua dor,pediu pra estar perto. E foi esta, justamente, a flecha que abriu a caixinha, de pandora, que distraída, observava a cena a largos passos. A menina espalhou para si todas as mazelas do mundo.
Ele negou e negou e negou muito a sua presença amiga. Negou três vezes os olhos frágeis da menina... negou a simplicidade dos versos que ela lhe trazia... negou o amor proeminente que guardavam, negou-se homem e se disse anjo... desprovido de asas; pra que nem que lhe viesse de muita astúcia pudesse voar pra bem alto ou longe.
E foi neste momento que aconteceu a coisa mais inesperada do mundo: ela abriu a boca. Abriu, em busca de guardar as dores do poeta pra si, certa de que conseguiria. Mas poeta sente mais que humano.. e ela era uma simples menina...
O poeta sofreu, chorou e pediu um pedaço do colo por ele mesmo destituído. A menina apenas riu... e ele não entendeu que o colo era seu por quanto tempo quisesse... Então ela estendeu os braços, sem nada mais dizer ou suspirar. E ele não entendeu, ainda.... A menina, então, lhe beijou as mãos e disse: " vamos tomar um sorvete?!?"
E eles saíram, de mãos dadas, pensando efusivamente no próximo passo.....