Sonho material
Era uma vez um sonho vivaz que temia não acontecer. A insônia fazia as próprias vontades e de olhos abertos não podia o homem entrar na solidão de seu inconsciente para voar as vontades que uma vida ao dia não sabia realizar.
Morava em seu mundo sonhando à luz do dia e no escuro de noites em que dormir era privilégio traduzido em cochilos de má qualidade. Para sonhar era preciso concentração ao som de tudo que o dia trazia.
No trabalho de quem queria sonhar, os sonhos de outros realizava, enquanto cada dia era subtraído por tudo que se paga para existir. Na esperança de um mundo melhor, escolhia seus algozes representantes, o homem de fé.
Seu cotidiano suado fazia acreditar nas mentiras, enquanto a ampulheta o deixava mais próximo de lá. Lugar qualquer sem volta onde o fim da luta também marca o relato de sonhos levados ao além.
Ele sabia que o mundo de cá lhe negava os sonhos já de chegada. Partiam vontades, cada vez menores, substituídas pela alegria de pequenas coisas que a vida vendia a preço chinês às margens de sua existência.
Comerciais de TV reforçavam sua impotência de não ter submetido a si aqueles que o fariam alguém. E se negociar não lhe era vocação, estudar muito menos. Fazia o que aprendeu por gosto certo de dizer dos erros.
Escrevia, sempre que podia, de todas as agruras que o jornal registrava e que a vida trazia ao vivo sobre o mal que explicava tudo o que via. E nesse tempo de tudo passando rápido, a informação era apenas canal do carnal.
Se casa, se procria e quem está para chegar verá sempre maior esperança cegar a lembrança de um dia melhor que passou. Passa a vida e todo melhor negado aos reis se acompanha de dias melhores para trás.
Há quem diga que de hora em hora a vida melhora. Talvez seja assim, pelo fim. Ponto final de não ser alguém, se não se tem a matéria. Mas se de hora em hora, piora, pelo menos é por tempo cada vez menor.