S O L I L Ó Q U I O
Onde tu estás, ó cavaleiro negro?
Imprevisível ginete gélido
De onde vindes e quando vindes?
Ó, anti-sentido da vida!
Cheia de pois não
Sou o teu próximo
A tua fúnebre missão
Mas diga-me, Ó cavaleiro negro!
Que tipo de morte tu me reservas?
Morrerei de morte natural
De câncer ou da mente?
Sempre será do coração, não é?
De tétano e fulminante enfarto
Ou apostemado carnegão?
Triturado em acidente:
De automóvel ou avião?
Diga-me perderei os dentes?
Para no velório triste
Ser chacota de muita gente
É lógico!
Tu vais antes me avisar
Se eu morrerei de AIDS
Cheio de falta de ar
Ah, não quero morte vulgar!
Então, negas-me esse direito
De saber como será feito
Quero saber como e quando morrer
Morrerei quebrado ou inteiro?
Diga-me ser funéreo e camuflado?
Muito ignorado, mas verdadeiro
Será de dor de doença
Fritinho, queimado ou
De outros jeitos afins?
De muito teu mau gosto
Com inflamação nos rins?
Ah, não queres me dizer!
Também não quero saber
De que forma eu vou morrer
Virás sem convite mesmo
Pois tu és o próprio falecer
Mas diga-me negra foiceira
Fenecerei no fundo de uma cama?
E tu me vendo a sofrer
Com toda a liturgia:
Médico, padre e carpideira
Evolando-me na dura agonia
De uma escura cegueira
Morte tu não és utopia
É dura e fria a tua realidade
Tu podes vir ó morte!
Fazer a tua última sangria
Até que eu me esvaia
Mas faça-me um favor
Não me venhas de tocaia
Quietinha cheia de zelos
Vem de curtíssima mini-saia
Quero ver o teu tornozelo
Esquelético e muito branco
Lúgubre de mortífero encanto
Não terei medo, nem recusarei
Esse inevitável encontro.