Tinha de ser assim

Pra ser sincero eu nem sabia mesmo que voltaria aqui. Não por agora, sei lá. É uma porra de uma ferida que acaba atormentando a gente e nos faz vomitar isso tudo que fica trancado num porão do coração e da cabeça. É uma velha mania de querer despertar a fossa – a bossa, talvez. Tinha cá pra mim um abismo grande e covarde, cheio de coisa nenhuma, sentimento de um fraco a beira de mais um fracasso clamando por uma luz, sabe?! Pois então que venha a tona.

Há tempos esperava ver como tudo se sairia, se as palavras voltariam, se o medo não as cegaria. E nem coisa nem outra. Ligeiramente necessidade. Foi isso. Dizer pra mim mesmo que eu não estava preso a porra nenhuma e que eu, com certeza, sabia onde trilhar. Eu disse, ‘dizer a mim mesmo’. Não que as coisas funcionem exatamente assim, ou nem mesmo nessa ordem. Nem sempre é tão fácil.

Parece que sumi por décadas, como se eu tivesse dado um tempo pra inventar qualquer coisa, sabe?! Ou esconder. Sabe-se lá. Eu nunca fui muito claro, nem mesmo pra mim. Uma foto estampada num bilhetinho qualquer exposto por ai. Mas eu também sei que ninguém me procuraria... Fiz eu mesmo então. Encontrei-me num fundo qualquer de baú com velhas quinquilharias. Li uma pancada de livros fudidos só pra me sentir mais um lixo qualquer. Saí de lá com uma nova filosofia: ‘não adianta, você não pode me fuder, porque eu já estou fudido, companheiro.’

Sabe, você se encontra por ai, sentindo coisas diferentes e se assustando demais com tudo que aparece, porque é novo. E nem sempre sabe lhe dar com isso. Então você para, pensa e fala: que precisa dar certo! E de repente numa tarde qualquer você decide que precisa escrever qualquer coisa pra se arrepiar novamente, como há tempos não acontecia. E nem sente mais medo. Sente, às vezes, um vazio. Não da pra não sentir, já que faz parte da droga toda. Decide, então, por seguir um herói, ser qualquer coisa que te faça melhor, escrever um bocado pra passar o tempo e ficar feliz por fazer isso; por ser sincero consigo mesmo. Nem que seja só dessa vez, mas se der certo, que seja ‘de agora em diante’. Sente dentro do coração que, de alguma forma, você tava perdido por ai. As coisas acontecem nessa ordem, porque o dia é triste e você se esquece de lavar a alma vezenquando.

Procuro alguma coisa que seja parte de mim e que esteja por ai. E senti uma força nesse vazio todo. Não dava pra prever tudo, não dava pra esquecer as combinações que eu tinha, mesmo que elas não fossem rimas. Mas alguém me disse que dava pra criar ou reinventar qualquer coisa, desde que fosse com coragem. Eu só precisava arrepiar por isso, sentir tesão nisso. Quando rebobino, eu não desisto, há muito para se encarar. E antes que fique escuro alguma coisa tem de ceder.

L Figueiredo
Enviado por L Figueiredo em 11/07/2011
Código do texto: T3089062
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