CONTUDO ELES SE MOVEM
CONTUDO ELES SE MOVEM.
Na verdade, ainda não sei o que escrevo.
Penso que exerço a triste atividade de me circunscrever, rodeando-me de subterfúgios e melindres existenciais e, em questionamentos impossíveis, tecendo fragilmente a minha pobre vida.
Por falta de uma inspiração genuína adultero a natureza pertinente ao ato de escrever, e mergulho na vacuidade do nada, escrevendo de uma forma absurda, muitas das vezes pífia, ziguezagueando e não saindo dos meus próprios e reduzidos limites.
Os sonetos e as elegias teimosamente afloram melosos, é a tônica dominante deles.
Alguns até se prestam como verdadeiros gritos da alma, outros, não conseguem ultrapassar a barreira do enganoso existencialismo, imiscuíndo-se peremptoriamente em achaques lamuriosos, inexpressivos e maçantes.
Tenho o hábito que já se transformou em contumaz de escrever, ou melhor, em descrever as mulheres, principalmente as loiras.
Não sei se é pela escassez da espécie ou, é por uma tendência maliciosa ou, quem sabe, uma fixação doentia minha.
Mas justo há de se dizer, elas me fascinam com a graça e a leveza como se fossem rimas sonantes perfeitas.
E que, com o balanço melífluo do corpo, transladam uma verdadeira canção andante.
Não que as morenas não tenham essas qualidades, mas dado à fartura e a diversidade, não as vejo portadoras dos seus encantamentos.
Todavia, eles existem e elas teimam em não saber disso, entretanto, preferem mostrarem-se insípidas, frias e misteriosamente órficas.
Por mais simplórios que possam parecer, estou falando dos poemas, eles denotam uma preferência acentuada pelo lirismo, um autêntico idílio, com sintomas de amor.
Pois, não lhes faltam os enfeites sentimentais travestidos com palavras como: ternura, paixão, desejo, carinho e sedução, pulcritude, lascívia, encantamento, magia e tudo mais.
Às vezes, eles se vestem plangentes como carpideiras contratadas, ora se prostram saudosos e nostálgicos com sensíveis vestígios de almas a fremirem arrependidas ou desejosas.
As elegias como não poderiam deixar de ser, são ternas e suaves, a bem dizer, um ensaio de prosa romântica, trazendo em seu bojo onírico fagulhas de um passado inapagado.
Os sonetos de estruturas consistentes e duras, perseguidos por uma rima alternada em cascata, tornam-se inflexíveis em virtude da métrica.
Essa ditadura parnasiana, esse tal de contar de sílabas que censura a expansividade da alma, fazendo-se engolir soluços intermináveis.
As canções e as baladas são as planícies de sonoridade, por onde o poeta se espraia e viaja silente com as estrelas, acompanhado do rumor do coração e dos ventos.
Elas são por si só umas tessituras angelicais, dado a sua sonoridade melodiosa, servindo com presteza aos ensaios lúdicos do poeta em vagueios místicos.
Gosto de escrevê-las, eu não sei se é porque se parecem com uma prosa graciosa e irreverente ou, porque elas dizem muito do estado de espírito do vate.
Aliás, em questão de estado de espírito, o poeta vive no plural, “nos estados dos espíritos”.
Ainda não escrevi uma verdadeira canção, pois que, a canção tem de vir bordada de sonhos e musicalidade.
E os sonhos andam tão escassos que me perco nas baladas, a última que compus fez o real efeito desejado, mas depois me arrojou em prantos, (talvez inúteis) acho que foi a balada final.
Não sei se disse o que pretendia dizer, mas também não farei como o Sr. Galileu que, na sua defesa de propósito jocosa e confusa, ante a inquisição e o santo ofício, disse ao final do seu ordálio o seguinte: “Contudo, eles se movem”.
Eráclito Alírio.