Mergulho...

O som borbulhante das ondas invade meu cérebro, como uma avalanche de idéias repentinas.

Cintilantes movimentos ecoam na escuridão sombria da Mãe-noite,

fazendo-me percorrer deliciosos caminhos em busca de mim mesmo.

Um grito abafado me percorre todo o corpo; e, inda antes terminem

meus pensamentos de voar, estarei eu à mercê das flutuantes estrelas,

que se perdem no céu infinito.

Refaço-me e transformo meus programas rotineiros em maravilhosas incursões dentro do meu ego, onde os cristalinos copos de vinho, aqui, são brindados em minha casa sem paredes concretas.

Reflito sobre a melhor maneira de ser e descubro que mereço ser autêntico: autêntico nos meus rituais do cotidiano - um cotidiano macabro e sem belos-horizontes.

Ah, pecado, embora teus olhos, neste momento, não me encontrem, eu estou aí, dentro de cada teu momento, presente na existência adolescente

dos teus desejos gulosos, enquanto os meus desejos perambulam, sonolentos, no destino insólito do próximo instante.

Acredito fielmente nas verdades que idealizo e grito de peito aberto:

o destino quem escolhe somos nós!

Os sonhos desvairados e cruéis transformam-se como miragens e eu, preso no inconsciente do teu sono, arremeto-me contra eles numa forma de mostrar que sou real: rei do meu trono sem pátria; pai das coisas que me saem pela mente, pela boca; sábio do idealismo poético, por acreditar na remissão das coisas omissas; irmão deste todo poderoso sentimento,

que um leigo profano ousou denominar amor; filho da água que nos purifica os prodígios mais ímpios e indissolúveis; o ventre da mãe tão amada,

cansada de ser objeto sem arte, escrava do seu próprio conformismo.

Mas orgulho-me de ser a própria vida, envelhecida em tonéis, através dos séculos, preparado para mais uma viagem de retorno ao seio do paraíso:

o indissolúvel e prepotente lugar perfeito...

Sou, acima de qualquer suspeita, covarde para não ferir e herói das minhas convicções: fraterno na igualdade e desonesto na anarquia. Ao porto onde almejo chegar, viajo no silêncio de meus idílios, quando meus olhos se fecham e descubro o prazer do mergulho ao centro de tudo,

onde o louco faz sentido e onde creio mais.

O meu doce mar, não se abala com minha insanidade, porque é sábio,

e se resguarda do mal em prol de sua recompensa derradeira. O céu e as estrelas sedentas são as inspirações psicografadas do meu passado poético, quando compus as previsões absurdas, que quase levaram-me ao fim.

Sou enfim, quase tudo que me ofereço e, quando não mais me posso doar, as entranhas putrefadas da glória afastam-se temerosas, mas convictas de sua decisão irrevogável.

E agora, no fim da caminhada poética, confesso, patético intérprete de vida vazia, que jamais vivi em mim.