Vendaval

Agora bate um vento em minha janela, fazendo leve trepidação em seus vidros. O barulho me faz lembrar do mar e suas ondas quando vêm beijar a alva na praia. Mas, a despeito do tremor, o ar que adentra não passa de uma brisa suave que roça-me a tez e faz brotar em minha memória lembranças de um recente desejo do qual fui acometido. E lembra-me de seu rosto, de seu cheiro, da sua tez, do vermelho de seus lábios, do brilho fosco em seu olhar – tão tristonho quanto enigmático, tão sisudo quanto delicado. Assim, sentado eu fico a curtir o momento e a lembrança de tudo o que quis e não fiz, de tudo o que desejei e não possuí. E, aos poucos, o que antes era brisa suave vai aumentando de intensidade. O leve tremor da janela transforma-se em princípio de terremoto, e o leve toque da brisa em meu corpo, mudara-se em correntes de ar mais velozes que a luz. Nesse cenário surpreendente e inesperado, vejo-me obrigado a segurar-me na cadeira, na cama e em tudo que impeça-me de ser levado para longe de mim e de tudo o que construí todos esses anos sobre a Terra. Com um pouco de sorte e depois de muita luta, as correntes de ar vão diminuindo de intensidade e partindo para outras regiões, indo, quem sabe, importunar outros tantos que estejam em situação semelhante à minha. Consigo levam as lembranças de sua face, de seu cheiro, do vermelho de seus lábios e do fosco brilho de seu olhar. E então, cabisbaixo e indeciso, concluo que um vendaval viera me visitar sob forma de brisa. Mas já passara, tinha cumprido sua missão. Depois de tudo isso eu volto a fazer o que antes fazia: escrever continuamente em busca do equilíbrio interno levado por ele, pelo Vendaval que passara por mim naquela noite e que passava por mim diariamente. Voltará?

Fabio Ferreira S
Enviado por Fabio Ferreira S em 16/01/2011
Código do texto: T2731838