Eu posso
Tudo posso. Não observo intenções, nem receio reações. Rasteio nos olhares, os silêncios. E não os reconheço, quando estridentes, quando usurpar é preciso, quando viver envenena. Todavia, caso os encontre, com eles posso. E deles duvido. Sempre duvido.
Não reconheço instantes repetidos e intermitentes, como não reconheço uma manhã plausível, quando pende e se estende para a direita. Da hora, o que eu busco é a palavra e se ela me falta, eu a procuro na ausência. Eu a encontro debruçada na calçada ali em frente. E rente, muito rente ao muro. E o muro, eu questiono. E a calçada eu enfrento.
Eu obedeço a minha inquietude serena. Eu luto e venço.
Do abraço, não quero o abraço; Quero o momento em que ele reage e reentra e envolve. E com ele sempre posso, porque dele sempre duvido. Orienta-me o rascunho da sede que tenho e a rasura que tem a estrada onde a sede me ignora. E eu não a temo.
Nada de rumores e rumares. Eu não rumo, eu olho e parto. Simplesmente. Entre o meu querer e o que me é exato, eu fico com o transparente, o invisível, o indivisível, mas se for preciso eu consigo e também duvido. Nada de coerências, nada de condensações. Eu não me rendo.
Às vezes, pode ser um som no ar, e solto. Pode ser paralelo, um ruído tranquilo. À vezes é um destino, um encontro, um vestido, um princípio ou um cabelo. Um terceiro reconhecimento de um outubro. Pode ser um novembro. No entanto eu duvido.
Concordar com a fuga é disseminá-la e estar nela é precisá-la, como quem precisa do sequestro, o endereço, e não importa, eu fico e brigo.
Faço, com o breve, o que faço com a sentença. Eu não me entrego. Eu permaneço.
Do amor, vejo o começo e até do amor eu duvido. Eu posso muito. No estorvo, eu estou no propósito apenas. Ostento uma tarde intacta e não espero retorno, porque ao ir, todos os caminhos ficam estreitos. Entretanto eu passo, porque eu posso. Eles marcham triunfantes e eu duvido. Eu guardo a marcha e aguardo no rasgo, todavia, os verifico. E aí não fico. Eu os vivo. Eu não me importo. Eu os enfrento, eu os interrogo.
Mas se me chega aquela tristeza cruelmente involuntária, aquela angustia que ela pressente, eu me desconcerto, eu parto ao centro e ao meio, e do que me resta, desconheço. Dessa, eu nunca duvido, jamais esqueço. É tão certa, quanto certeira. Acerta-me e eu simplesmente não posso, porque o próprio poder se ausenta. Não há dúvidas, ela não as deixa e eu a temo. É covardia e é insano, você não tem as armas e ela já chega lutando.
Em: 16/08/2010