Abstração ultra romântica
Às escondidas, recôndita na penumbra daquele gélido desamparo mudo, ela lacrimeja e soluça cabisbaixa sem encarar o seu reflexo brumoso que paira no pensamento incompleto e errôneo.
Bate no ar a pesada pancada incômoda dos ponteiros do tempo eterno a cada suspiro de tristeza incompreendida.
Ela está na tênue escada da sanidade onde cada passo é uma tortura, pois deve ser dado com o máximo de cuidado e atenção; o abismo está lá embaixo, com seu olhar sedutor, lascivo e seu incansável chamado sibiloso que ecoa na consciência fragilizada.
Nem os deuses entendem tamanha angústia!
Quando o sono vem é um desespero: figuras remotas de esplendores arcanos, vestidas em trajes celestes, avançam em seus garanhões negros com olhos dardejantes; a fumaça rodeia as cenas e o terror se prolonga na madrugada interminável. O que consegue apaziguar tal alucinação onírica é a total entrega na escuridão dos túneis que se projetam lá embaixo, na ampla terra árida.
A desolação se estende com o alvorecer.
Ela expõe suas olheiras no semblante macilento – consequência de mais uma noite de sofrimento – e, incrédula, desperta para o mundo, embora em si própria sente que não mais pertence a ele.
E dessa forma mórbida, degradante, sua existência se arrasta; seus desejos tornam-se pecaminosos e a única fagulha de esperança é voltar a sentir sua aflição.
Seu horizonte se restringe a essa dor insanável e o resto de sua vida será determinado por todo o mal vivido abstratamente como sendo de fato real.