Entardeço
Meu retrato é como este sol fugitivo e contraditório,
dizendo o “adeus” da partida vespertina,
enquanto mira suas beiradas arrastadas pelo mar imenso,
cujo azul ganha tons alaranjados e acobreados de saudades.
É ouro que amadurece e acalma minha ansiedade
e meu olhar aguçado pelos matizes estroboscópicos diurnos,
limitando minha visão e minha imaginação.
Este entardecer doce e ameno, como eu,
já foi o jovem sôfrego caminhando para a frente e para o alto, no entanto, a maturidade sapiente natural verga seus raios suavemente, fá-lo voltar, no auge do seu fulgor,
às raízes celestes criadoras e pausar o momento que clama por inércia.
Paisagem dupla:
no céu e no mar, duplica minhas aspirações,
que tremulam ao tom do cobre das águas benditas,
e faz vibrar minha alma selvagem, sedenta de natureza virgem.
Brincando de partir, o sol vai ficando,
enroscado às marolas cantoras, cativo das sereias lendárias;
segue ele afogado nas profundezas do meu ser, inebriando meus sentidos.
Se ele se põe ou nasce, fico em dúvida a pensar e a amar a Deus, nosso pai-criador poderoso, pela dádiva da vida.
Assim é que, perco noções de tempo, perspectiva,
de proximidade, de longitude, pois enquanto entardece,
meus olhos esticam seus braços clamando calor e o têm,
seja na miragem do espelho azul-doiro-marinho,
ou no vulto de brasa riscando os céus.
Chego mesmo a crer que é infinito,
é eterno este entardecer vibrando no mar da vida,
fazendo-me pressentir o entardecer de amanhã,
com novas promessas douradas de calmaria.
Santos-SP-31/08/2006