PÃO E CIRCO
Nada lhe causava espanto
Tão pouco se comovia com o sofrimento alheio
E não via motivos altaneiros no beija-flor beijando a flor
E meditabundo transitava pelos caminhos da metrópole
Que se consumia em arranha-céus e congestionamentos sem fim.
Na verdade era iâmbico com os demais
Que julgava imerecidos da sua companhia
Embora a só no seu cubículo a cheiro de mofo
Lamentava as noites de inverno sem um alguém
Que lhe desse ouvido ou a mínima atenção que fosse.
Recostado às vezes na janela velha e enferrujada
Dizia de si para si, frases incompreensíveis
Pois a bem da verdade nada dizia
Balbuciava lamentos à falta de coragem
Invejada naqueles que condenava.
Seguidor a contra gosto dos ditames
Da ordem estabelecida e a todos imposta
Mentia pra si tratar-se de auto-preservação
Pois homem das letras como era e assim se enaltecia
Dizia contidamente que quem domina a escrita
Dela poder-se-ia fazê-la espada se assim o queria.
E no cadafalso outros corpos
Ao público oferecido em espetáculo e alerta
Silenciosamente a multidão se comprazia
E de olhos arregalados e rostos pálidos
Lamentava em memória aqueles moribundos que se batiam.
E ele testemunha desses tempos
Nada via
E no próximo dia ao trabalho iria
Dar ao povo o espetáculo de todo dia.