O Vale do sono
No jardim plácido onde o silêncio reina imponente,
A Psique entorpecida – sentindo o vibrar de cordas das harpas celestes – Deita na relva orvalhada suspirando o Sono divino.
Morpheu com seus cachos brilhantes
Induz ao mais profundo letargo,
Cujo delírio inibe aos olhos uma brecha.
O paraíso das névoas brandas e esbranquiçadas
É um templo ao céu noturno estrelado.
O aroma de ervas e incenso colhido
Pelo vento da noite modorrenta
É espalhado pelos campos abertos em que deus
Algum ousa perturbar a tranqüilidade onírica.
Corpos esbeltos de jovens idílicos jazem
Nas plumas prateadas dos cisnes;
Estranhos seres incorpóreos e pequeninos
Soltam, em uníssono, o sibilo inaudível do ronco contido.
Vésper, pertinaz em sua trajetória rija,
Não se fadiga e persiste em radiante esplendor longínquo.
Os caminhos onde outrora Íris percorreu cuidadosa,
Ainda guardam as cores esquecidas.
Há uma fraca luminosidade que possibilita diferenciar
Formas e coloração nos diversos pontos
Por onde os olhos lançam um olhar sonolento.
Quando por fim as pálpebras descem,
A Fantasia inicia seu espetáculo!
O vale cativa com seu silente chamado;
Zéfiro afugenta os barulhos do norte
(Éolo permite o fardo dele apenas),
De outros rumos advêm doces melodias de ninfas virgens
Que cantam para sua deusa Diana;
Sons possíveis apenas ao ouvido da alma
Que dorme em algum canto recoberto de tecidos escuros.
Pobre do ser lançado no infindável sono!
Prazer não sente, e se sente não sabe.
Bem-aventurado quem imergiu no eterno sono!
Lembrança alguma há de ter da vida sofrida.
No piso de mármore – entre os pilares dóricos –
Acariciado pelos dedos suaves de sonhos ininteligíveis,
O ser humano errante, que por acaso aí se encontra imóvel
Envolto na atmosfera da subconsciência, descansará
Por toda a existência mítica do vale.