A voz do teu mar
Ainda agora me lembro do dia
Em que nos vimos ao anoitecer!
Tudo em minha alma ainda sofria
De uma ilusão que vinha de morrer.
Algum gesto calado reteve o teu olhar,
Alguma coisa que de ti desprendia,
Solene como o escurecer após o dia,
E tão triste como a lua sobre o luar.
Só mais tarde é que vim reconhecer
Que esta dor tão camuflada em teu olhar
Era a mesma procura de um ter em teu ser
Ou de um labiríntico fado a divagar,
Pois nos falamos sem nos conhecer,
Enquanto longe rugia a voz de nosso mar!
Teu calmo mar é o meu colérico rio mudo,
Teu longo rio é meu alegre e rompível escudo
Onde o teu ser sisudo tão cheio de intuitos
São as tuas lágrimas em nosso amor agudo,
E este sério silêncio é o nosso gozo desnudo,
E as almas amam-se nesses barcos fortuitos.
As vozes silenciosas do mar a ir e a voltar
São as ondas quebradas do teu oceânico olhar.