Hibernação
(Pele que não é mais minha
Sonho que não me emociona)
sinto que larguei a linha
no meio do meu vestido,
e ele vai ficar assim mesmo
cobrindo só um pedaço,
porque ele não serve em tudo.
ainda posso ter as aulas de bordado
e aprender a fazer outro, do rascunho
ainda... ainda bem.
ainda sei o que visto
(essa obra do meu próprio punho)
ainda não sou doente,
mas a perda das linhas me tangencia da doença...
então aprenda, aprenda de uma vez!
e vista o seu aval de licença:
essa nova face que cobre a velha,
o pelo que aquece o inverno de nascença
inverno... que eu conheço o nome e a forma
inferno de dormência e de hipnose,
algoz e arcanjo dos meus grilhões de aço –
ainda é a força de toda a minha cianose
(num susto sobressaltado)
... eu não posso ter aulas de bordado!
nem fugir da limitação que me move
que dessa linha se nasce escravo, e se morre:
minha roupa é este retalho colado...
eu sei... mas ainda não é tempo de ser...
é tempo de hibernar calado.
ainda que seja fadado, gênico,
cobra que perde a pele morta:
é um mundo cênico
– eu choro. por dentro
– para persistir vivo por fora
– reconstruindo o rosto mímico
– dissimulado. até segunda ordem
é um mundo cínico