Hibernação

(Pele que não é mais minha

Sonho que não me emociona)

sinto que larguei a linha

no meio do meu vestido,

e ele vai ficar assim mesmo

cobrindo só um pedaço,

porque ele não serve em tudo.

ainda posso ter as aulas de bordado

e aprender a fazer outro, do rascunho

ainda... ainda bem.

ainda sei o que visto

(essa obra do meu próprio punho)

ainda não sou doente,

mas a perda das linhas me tangencia da doença...

então aprenda, aprenda de uma vez!

e vista o seu aval de licença:

essa nova face que cobre a velha,

o pelo que aquece o inverno de nascença

inverno... que eu conheço o nome e a forma

inferno de dormência e de hipnose,

algoz e arcanjo dos meus grilhões de aço –

ainda é a força de toda a minha cianose

(num susto sobressaltado)

... eu não posso ter aulas de bordado!

nem fugir da limitação que me move

que dessa linha se nasce escravo, e se morre:

minha roupa é este retalho colado...

eu sei... mas ainda não é tempo de ser...

é tempo de hibernar calado.

ainda que seja fadado, gênico,

cobra que perde a pele morta:

é um mundo cênico

– eu choro. por dentro

– para persistir vivo por fora

– reconstruindo o rosto mímico

– dissimulado. até segunda ordem

é um mundo cínico

BebêAzul
Enviado por BebêAzul em 15/01/2018
Reeditado em 22/01/2018
Código do texto: T6226846
Classificação de conteúdo: seguro