Confusão poética

Hoje eu lhe quero.
Amanhã eu lhe perco.
Dentro da bolsa.
Dentro do armário.
Fechado na gaveta da alma.

Hoje eu lhe quero.
Amanhã eu lhe mereço.
Trago o peito coberto de medalhas.
Venci algumas batalhas.
Mas nem todas.

Perdi as migalhas
espalhadas no templo.

Hoje eu lhe quero.
Com a perenidade do entardecer.
Sangrando e perdendo-se no céu
pouco azul e tão chumbo.

O querer da primavera.
O pólen e a brisa.
Casal perfeito.
Um redime o outro.
Um complementa o outro.
Um é reticência do outro.

O perder do inverno.
A fria manhã e o reumatismo.
Casal ocasional.
Velhice contundente.
Depoente nas manchetes
diárias de vidas comuns.
Rotineiros e banais.

O merecer do verão.
Cores quentes.
Temperaturas altas.
Senegal a pino.
Esfregando o sol nos corpos.
Noites embriagadoras.
A melancolia e o álcool.
Casal incandescente.
Verborrágico.
Sensualizado por ebulição.

Mas nem tudo é paixão.

Chega um dia.
Uma noite.
Um acaso.
Em que querer,
perder ou merecer
são sinônimos abstratos
da mesma concreta confusão.
 
GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 02/07/2014
Código do texto: T4866529
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