Algumas palavras (I - V)
I - (19.12.2013)
Ser simples como o orvalho
E misterioso, mesmo sem saber do mistério
Pois não saber é ser belo
De uma beleza viva do não pensar
Que o pensamento não é triste nem alegre
Nem vale coisa alguma para o mais sensível dos seres...
Então ser belo como o orvalho
Que nada sabe sobre si
E assim mesmo permanece
Belo para o sempre
A ser contemplado cegamente
Pois só a inocência
É capaz de ver a beleza
Presente nas pequenas coisas do mundo
II -
(19.12.2013)
(sobre um sonho)
Era bela e triste
Uma beleza melancólica
E eu me sentia melancólico e só...
Como um filme do Tarkovsky
Imensa e lentamente lenta...
Lenta... e lenta...
Como se toda aquela paisagem não me compreendesse
Nem eu me compreendesse
E aceitasse que era incapaz de um dia me compreender
Pois não pertencia ao tempo dos homens
Mas a algo diferente e tão mais eterno
Que de apenas olhar me entristecia docemente
A desejar jamais ter nascido triste e mortal
O ranger leve do metal
O trote languido dos cavalos
Que andavam com a simplicidade dos dias mornos
Em que se quer sentir o Sol e somente isso
A brisa terna que acariciava os montes
E trazia algo de indecifrável em seus sussurros
Que meu íntimo decifrava sem me explicar claramente
E enchia-me de dores intraduzíveis
E por serem intraduzíveis
Doíam-me mais e mais...
E essa insuportável sina de ser mortal
Triste fugacidade que se não fosse fugaz
Não seria bela
Nem seria eu capaz de sentir algo tão profundo
Se não entregasse também meu mistério interior a ela
Imensidão triste e só
III - (14.01.2014)
O instinto é a mais transcendental das experiências
Nos coloca em comunhão com o universo todo que veio antes de nós e com tudo que ainda virá...
É o ato divino mais simples da natureza
E nos acorda para um desconhecido familiar, nos faz capaz de reconhecer em outros olhos, em outras espécies, uma parte toda infinita de nós que fugiu no momento em que começamos a existir...
O instinto cria corpos finitos prontos para viver a infinidade de outros corpos finitos, para assim também se descobrirem infinitos.
Cria eu querendo dizer nós
IV - (11.01.2014)
Ser artista que nem uma criança
Que faz um traço certeiro na folha em branco
Sabendo que será uma baleia
Um astronauta ou um dinossauro
E não é que nem a gente
Que tem medo até de começar
(imaginar)
V - (18.01.2014)
Se acaso existe um Destino, vivo a contorná-lo. Não por falta de caminho, mas de vontade. Se não há, vivo para contemplar e homenagear o mundo e a vida, que me criaram indivisível a eles.
Não preciso acreditar em algo (nem desacreditar tampouco), pois no fim não existe tanto sentido como nós tanto buscamos.
Vou viver dos meus instintos, e meus instintos dizem calma, que o nada também é um lugar pacífico.