Striptease

Despi de mim, peça por peça:

As roupas rotas

que lembravam um passado

sombrio, desencantado e descabido

O coração

para que não atendesse a nenhum apelo

e não pulsasse mais em descompasso

O sexo

para não mais cair em tentação

e não mais morresse de tesão

O amor

que se condenou à paixão

para que não mais me envolvesse em confusão

O sangue

pássaro vermelho jorrando assustado

para que não mais fervesse em desespero

As palavras

antes que escapassem pela boca

no momento indevido, causando estranheza

A pele

com marcas de sua boca sedenta

a fim de que não mais delirasse com seu toque

Os braços

para que não mais envolvessem seu corpo

sentindo o calor de um amor insano, louco

as pernas

para que não se deixassem levar

por caminhos de dor e ilusão

Os cabelos

para que se renovassem como leve nuvem

e não mais se embrenhassem em seu suor

Os olhos

para que não se nublassem à claridade do dia

nem vislumbrassem sua beleza que provoca...

As mãos

para que não mais buscassem seu ser

acarinhando sua pele, dando-lhe prazer

O nariz

para esquecer o aroma de sua sedução

e negar a delícia de seu cheiro de homem

O pensamento

que me feria as madrugadas

para que não mais me lembrasse de seus beijos

Os ouvidos

para que não ouvissem os gemidos de alegria

e se fizessem surdos à palavra que os seduzia

os pés

que, aves feridas, iriam te buscar sempre

mesmo por caminhos tortuosos e inconstantes

Os dedos

que nunca desataram seus nós

para não toquem nas feridas de minh'alma

o meu canto

que entoa a tristeza de estar só

para que não mais se prenda às minhas notas de agonia

e, finalmente

o meu corpo...

para que não se curve, colhendo as agruras do tempo

apenas se renove, despindo-se da casca da amargura

e revestindo-se com a nobreza da alegria...

Francis Faria
Enviado por Francis Faria em 21/04/2007
Reeditado em 21/04/2007
Código do texto: T458666