Aconteceu

Aconteceu que

Quando eu quis ser Deus

Minha humanidade brotou ainda mais forte

Procurei voar e não pude

Quis salvar o mundo

E o mundo salvou-se sozinho

Indiferente aos meus esforços

Nada do que fiz deu certo

Minha manhã perdida em conjecturas

Como extrair o suco do Tudo?

Como sorver o Mistério

E dele tirar a mágica dos super-homens?

Desmesuradamente comum me achei

Divindade perdida e consumida

Nada havendo a alçar-me além

Dos outros deuses-em-projeto

Com quem ando dividindo

Este mundo miserável

Vejo, assim, minha aspiração

Fraudada pela rasa realidade

Já não posso mais desejar

Ser o herói dos meus dias futuros

Nem almejar a fortuna

De alforriar-me do óbvio

Senhor das minhas necessidades

Sonho, ficas para mais depois

Para o recôndito, onde tudo

Ainda é promessa: Fantasia

Este envergonhado

E impotente demônio

Que ainda cultivo

E do qual continuo a ser

Inepto e obediente cativo

Permanece, obtuso, a embalar

A criança impossível