Flor de parede
Diante dessa primavera concreta.
De contornos rígidos e
enigmáticos.
De pólen imaginário.
Floresce um lirismo contido.

As gotas de chuva na vidraça.
Lembram-me suas lágrimas.
O orvalho da manhã regado
ao brilho tímido do sol.
Desperta lentamente os sentidos.
Ressentidos.


A primavera sem a fragilidade e
nem perfume.
Armada feito escultura
e referencial nessa parede.
A dar ênfase ao feminino
e ao delicado.
A sublinhar seus cílios
e a grifar olhares.

Verticalmente inflexível.

Os fonemas gritam seu nome
em minha garganta.
Mas em mim, impera o silêncio
da ausência.
Nas paredes inscrições noticiam
o romance. 
As paredes envelhecem
e narram o fim do amor.

Se existiu, sequer resistiu.
Frágil despedaçou-se.
Rasgou cartas.
Quebrou louças.
Danificou vidas
e sentimentos.
Ressentimentos.

Se existiu, apagou a trilha
que levava até a você.
Restaram reticências,
vestígios e rabiscos.
Auras apagadas no hd.

Mas dizem que tudo deixa rastros.
E que os andarilhos ... 
sabem como encontrá-los.

Há gotas de chuva.
Há invernos glaciais.
Há primaveras coloridas.
E, finalmente o verão
a queimar as cinzas,
queimar os corpos e 
incendiá-los intensamente
na pira da paixão.

Deixam cinzas de cinzas.

Depois. Bem depois.
Restará a dúvida.
A mera existência do papel.
A assinatura tremida e sofrida.
Os olhos que não brilham mais.
Perderam o viço.
Agora, o horizonte apenas
traz  dependerado nalgum lugar
um bilhete de despedida.

Sua vida se esvai.
Pelos ralos insensatos.
Pelo furor das feras.
Pela vida de quimeras
Pelos gestos inexplicáveis.

A vida é finita.
Diante da primavera de concreto.
De cores exatas.
De tons milimétricos.
Na geometria
insensata do acaso.

Enfim, nosso caso foi
o acaso da equação vivida.
GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 15/05/2014
Código do texto: T4807224
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