Ih! É Carnaval
Quando muito se deu conta
de que não é atabaque de couro cru;
a voz reverberou,
encheu o coração de ar
e o pulmão de dor.
Ardor, dourar, durar
o impulso de uma tristeza;
toda a certeza de uma cilada para Roger Rabbit.
Quando muito se deu conta
de que não tinha pandeiro.
Entrou no galinheiro
e pegou na voz do canto do galo.
O calo gemeu no meio do local,
o surdo marcou o ritmo
da imensidão do samba-enredo.
Quando muito se deu conta
de que não foi o arlequim
que ela exigiu de mim.
Mandela perdeu o tamborim.
A chuva pintou, entrou no botequim.
O contra-regra chegou,
a voz falou assim:
a cidade padece do controle do vazio.
Quando muito se deu conta
de que não foi o adereço
que não lhe caiu da mão,
nem o preço da ilusão que não tinha.
Submersa talvez a voz da rainha
que vinha na sua direção;
lantejoulas de emoção, o reco-reco da repetição.
Sumiu o marreco no fundo do meu quintal.
Quando muito se deu conta
da virtude do tarol
que destaca o tom febril
da mulata ao requebrar.
Mas olha que ele não viu
a conjuntura sutil
do belo quadril. Não há voz.
Não há ninguém perto de nós.
Tomou Doril no quadrilátero de Trancoso.
Que gozo que foi a aurora do jequitibá.
Quando muito se deu conta
do samba naquela avenida.
Cantou com a voz esquecida,
a cuíca roncou exaurida; a platéia, agradecida.
O repórter o pegou pelo braço forte da rede CBS.
Na Apoteose, a fama. Se inflama o segurança na tosse,
o suspensório caiu, a fantasia proclama
a Escola de Samba Brasil.
Rio, 11/02/1994