A ditadura da aparência
Jovem, 17 anos, morena... bem brasileira
Entrou na loja
Saiu na zoeira
Madura, 35 anos, branca... brasileira
Entrou na loja
Saiu...
A musa era bela, de encantos avassaladores
Era plena, e pelos olhos do poeta era eterna,
Com o encanto mais vil
Corpo envenenado por uma camada atmosférica de sabor
Dos lábios adornados.
Anda dançando na mais conquistadora desventura
As roupas que usa conotam um tom de meretriz seleta
Mesmo que não se prove na prática
Mas na minha matemática
Aquela magistral exposição
Estava do pensamento clamando
Por uma incrível abominação.
A musa era bela, dos encantos sem precedentes
Era sem estilo ou guarda roupa
E não denotava volúpias intensas
Viam-se nos seus olhos a latência
De um algo a despertar
E em meio às torrentes eternas
Tínhamos visto desabrochar.
A musa... não rebuscava
Não abusava se detinha
Como ave marinha
Dava um salto pelo mar
E andava muito mais longe
Do que podemos imaginar.
E como em um sonho
Das duas pude provar
Mas apenas de uma só
Pude me deleitar
Caminhava eu entre as flores
Em um bosque claríssimo
Envolvia-me um cheiro dulcíssimo
Das rosas e demais florais
As aparições surgiram
Na mais fina asserção
As duas ao meu encontro caminhavam
A meretriz e a donzela
Caminhavam entre as flores
Como se o esperado fosse se armar
Chegaram todas juntas
E um diálogo começou a se traçar
A donzela muito tímida
Deu a vez à meretriz
Que nada, porém, falou
Apenas se fez desejar
Exibindo seu corpo
Para o poeta encantar
O poeta enamorado
Pela sedução da sereia
Levantou-se prontamente
Ao caso de ir-lhe cegar-se
com a vil intensa candeia
Estava quase surdo
E nada lhe podia mais encantar
Pois a sereia lhe tinha
Dado o mais poderoso fel
Que pelos seus instintos
Das suas correntes quebrou o anel
A tímida em sã viu o ocorrido
Fazendo muralhas caírem
Do seu íntimo travou um ruído
Do mais intenso frescor
Da mais calorosa candura
E em versos de cordel
Traçou sua vestidura
Ofuscando a beleza
Da agora, martirizada meretriz
O poeta feliz
Em um salto aos braços da agora, amada
Irradiou no mais intenso
No mais livre, no mais propulso alento
Como um sol a lua clarear
Do feixe de luz ao diamante
A todo ambiente iluminar
A meretriz que não mais impera
Quando a luz veio lhe ofuscar
Qual larva fumegante
Em inferno disparou
Provando que a sua ditadura
Nunca mais se imperou
Pois ela veio de luz
E voltou no escuro
E a verdade não roubou
Pois a aparência não faz versos
Qual a donzela proclamou