O casarão
A subida sinuosa
Vai dar naquele solar
Rodeado de pinheiros
Até onde a vista alcançar
Na frente, se estendia
Exuberante ramagem
O casarão imponente
Dominava a paisagem
Um carvalho majestoso
Ensombrando a bela entrada
Mais parece uma sentinela
Vigia quem vem pela estrada
Azulejos portugueses
Decorados, no patamar
Heras cobrem um muro
De construção linear
Um certo ar decadente
Na fachada, muito embora
No frontispício se veja
O antigo fausto de outrora
Um guizo no pórtico largo
De angelim resistente
Portinhola entalhada
Inscrições sobre o batente
Protegendo contra as chuvas
Um generoso beiral
O dourado sol se esparrama
Nas violetas do quintal
Na fonte, uma escultura
De pedra-sabão lavada
Um leão que jorra água
Pela boca escancarada
Os detalhes do estuque
No teto abobadado
Lambri de jacarandá
Nas paredes, assentado
Na alcova, papel floral
Já um tanto desbotado
Nos fundos, a gruta da Virgem
Uma edícula e um orquidário
O casarão é uma pintura
Mais parece um santuário
Postigos em amplas janelas
Balaústre e o enorme vitral
No salão nobre, em pêndulo
Candelabros de cristal
Um mudo relógio-cuco
Que algum dia foi sonoro
Guarda em seu interior
O passarinho canoro
Um jarro de porcelana
Em cima do peitoril
Um pequeno bem-te-vi
Pousado sobre o gradil
Ainda resiste altivo
O velho caramanchão
A brisa ajuntando as folhas
Desenha um tapete no chão
Sobre a pérgula de madeira
Madressilvas como enfeite
Trepadeiras debruçadas
O jardim para o deleite
Desgastados pelo tempo
No gramado, solitários
Rudes bancos de cimento
Que ali jazem centenários
No sótão deixaram esquecidos
Oratórios, restos de ouro
Imagens, baús de nogueira
Com rebites e tiras de couro
É como se eu lá estivesse
Debaixo da casa, o porão
Que esconde estimadas relíquias
Sob o pó da solidão
A arquitetura solene
Que o palacete revela
Lembra mais uma figura
Pintada num quadro em tela
Aquele lugar soberbo
Abrigou minha inocência
Hoje ficaram as lembranças
Daquela saudosa querência!