SOB O CÉU AZUL  O TORRIDO SOL DO ENGENHO
 
As pernas pareciam cambão de maniva,
O ventre uma cabaça de caldo de cana,
O rosto estava à pura visão da miséria,
Acostada a pilastra a sua mãe Sa Ana.
 
O sabor do melaço no vapor que subia,
Espalhava-se no ar de toda a bagaceira,
Chegava até as narinas de Pipo criança,
Sentado num tronco de velha madeira.
 
No “tendá”, como o mestre chamava,
O local, onde a rapadura era atirada,
Em pilhas montadas, para o garajau,
O Pipo engolia a raspa ali separada.
 
Na pança do Pipo os riscos deixados,
O caldo marcara, na fome matada,
No prazer daquele olhar cabisbaixo,
Mãe e filho em fila de perna afinada.
 
Engenho de cana, menino de engenho,
Sua fome matava nas sobras do mel,
Nos caminhos por entre os canaviais,
O menino sozinho sorvia o amargo fel.

De longe traziam a bóia: farinha e feijão,
Moravam nas brenhas, pro lado da mata,
Descalços, vestes parecendo molambos,
Tristes vidas,  cansaço, e o sol que mata.
 
Guardei na lembrança o Pipo menino,
Sa Ana a mãe, Zé Rufino pai e esposo,
Almas gemeas, de um mesmo sofrer,
Sob o azul tórrido de um céu esponjoso.
 
                              Rio, 02/o7/2012
                            Feitosa dos Santos