QUASE FÁBULA

Estando de um poço à beira,

a jia botou sentido

num caçotinho atrevido,

que vinha dando bobeira.

“Olá!” – declarou-se a jia.

“Você, assim, tão sozinho...

Vamos levar um papinho?

Era tudo o que eu queria.”

Mas o caçote, matreiro,

disse: “– Já vou de passagem.

Vi, bem ali, a visagem

de um jacaré carniceiro.”

Tudo tática do bicho...

Por intuição, sabia

que, voraz, a dona jia

jantava rãs por capricho.

Não esticou qualquer prosa;

o caçote foi supimpa,

só para ter barra limpa

e não passar rebordosa.

E lá se foi o caçote,

cortando atalho, de lado,

sem atender ao chamado

e, claro, a temer um bote.

O caçotinho mentira;

jacaré nenhum havia.

Só que mentir para a jia

foi mais vida ter em mira.

Assim também faz a gente

à beira de algum perigo;

melhor é manter o trigo

e vê-lo dar mais semente.

Fosse o caçote cair

da jia numa cantata,

certo estaria na mata

sem seu cão para latir.

Do caçote o cão seria

prever perigo iminente

e sair pela tangente

da bocarra da tal jia.

Fort., 20/11/2010.

Gomes da Silveira
Enviado por Gomes da Silveira em 20/11/2010
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