Um prego no pulso
corpo nu de vida, doce
carne da palavra, água
suja de suor, corte
na superfície do sonho, medo
da porta entreaberta, mágoas
dilacerantes do peito reprimido
qual a verdadeira face da vida?
Poetas demais já esmiuçaram esta pergunta
e poetas demais já morreram por ela.
Serei mais um?
Quantos eu serei depois de encarar a lacuna da minha existência?
Seria eu um grande buraco negro dentro do céu de minha boca?
Ou um mero exemplo da fragilidade globalizada em que nos tornamos depois de termos deixado de sermos nós mesmos para sermos o outro?
quantas palavras ainda direi?
"Meu Deus, Tuas palavras benditas me sufocam
no momento em que apenas preciso de um tapa,
e Suas palavras benditas, benditas demais, me amparam, me confortam,
e só depois vejo que foram elas o meu alicerce e,
mesmo assim, preciso de um tapa
na cara
para me humilhar..."
"Os humilhados serão exaltados"
Chega....chega... vácuo...
Depois desse corte na superfície de meu sonho
posso ver que a porta entreaberta está assim porque eu a deixei assim
e mais uma vez, dentre todas as vezes,
o meu corpo se despe de toda a delicadeza humana
para ser mais um podre humano, nu de pudores e sentimentos
para reprimir os mais recalcados desejos de amor,
desejos de vida ou, quem sabe,
de mais uma noite de sonho
de mais um dia de chance
...
Perdi a minha chance.
...
Acordo. Corpo rijo. Testa molhada. Boca seca.
Mão espalmada. Um prego no pulso
e toda a culpa do mundo em meu coração,
todas as lágrimas aos meus pés.
... e o sol surge.