PRAGA

Há uma estrela

que teima em guiar-me

por caminhos que eu não conheço.

Eu já fui tão castigada,

tão incompreendida,

tão mal tratada,

vítima de violência e bullying,

estes são caminhos que eu vivi,

que conheço bem

e estão entranhados no meu núcleo.

Agora sou cautelosa,

desconfiada,

receosa,

porque ainda sinto o estilete

cravado na minha carne.

Foram dores que eu catapultei

para as masmorras

do meu subconsciente.

Uma recente perda

dolorosa e irreversível

fez emergir toda a dor submersa

que eu julgara resolvida.

O nosso subconsciente

funciona como o disco rígido

onde fica tudo

devidamente arquivado.

Esquecemos as coisas triviais,

aquilo que é tão insignificante

que não vale a pena arquivar,

contudo

aquilo que nos condicionou,

nos sugou o sangue,

nos fez trepar o arame farpado

e nos fez ser como somos,

jamais será esquecido.

Perdoado sim, esquecido nunca.

As lembranças

mantêm-se inalteráveis

desde o momento

que os factos aconteceram.

Os meus carrascos

foram também os meus escultores.

Somos a obra das nossas vivências...

Dores antigas subiram á memória

e apoderaram-se da minha retina

e voltei a ver o mesmo filme.

A garra duma outra dor

arrancou a postela da ferida.

Apetece-me gritar

arrancar-me destas lembranças

e voltar a ser livre!

Lá fora neva e está frio,

um manto branco cobre a noite.

Cruzei as mãos

pressionando-as contra o peito

e o meu grito rasgou a noite

e feriu o manto branco de neve

deixando-o maculado pela praga

que contamina o coração do homem!

©Maria Dulce Leitão Reis

Copyright 10/01/21

Maria Dulce Leitão Reis
Enviado por Maria Dulce Leitão Reis em 10/01/2021
Código do texto: T7156625
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