Agonia

Agonia, tão vil, feroz,

Que ao meu lado tem estado

Como pode em tresloucado

Transfigurar o homem assim?

Que raios gozas de mim

Que nem pertenças tenho?

E, se algo tive, foi engenho

Que, ora mortos, me têm abdicado.

Contenta-te com o mal

Porque a fraqueza quem te assiste.

E se há voltado, é pois

Que tua lembrança é dissipada

No instante mesmo em que saíste.

Ora! Vim dizer-te! Contra ti atento!

Ao teu relento, não pedi sequer favores.

Andarilho, em meus mais dias,

Tiveram em mim alegrias

Intensas mais do que tuas dores.

Fraca, vil e mentirosa!

Tu jogaste em mim – ó venenosa! –

Martírio e peçonha, quando

de umbrais fizeste as fronhas

em que detido eu me aqueço.

Em que momento tão míope fui,

Que tu entraste em minha casa e

Amputado eu tivesse as minhas asas?

Quando, da noite a volúpia soa,

Tu maltrataste a minha pessoa

E roubaste a minha sanidade?

Pelo dito, ando assustado.

Sustentado por somente sorte.

Como que temente a fortuna, morte

Ela me trouxesse qualquer dia.

Toma minhas mãos, como estão frias.

Vide também o céu que desbotoa em chuva rala

Alguns nascem sem fé, supremo deus...

E sem meios de exercitá-la.

Pois até minha alma, meu caro,

Onde estará, se não com o diabo?

Thiago Inácio
Enviado por Thiago Inácio em 21/09/2020
Código do texto: T7068689
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