Vícios

Precisava espairecer

Caminhar pela cidade

Se anular em meio à multidão de transeuntes

Para que a raiva exalasse pelos poros

Comecei a ouvir o som das ruas

Mas já não sei se o barulho infernal era interno ou externo

Motoqueiros trafegavam enlouquecidamente pelos corredores

Enquanto automóveis presos no congestionamento

Compunham a paisagem

O ruído entrecortado desses motores

Misturava-se ao barulho de sirene

Lembrando que no fundo somos todos prisioneiros planejando uma rota de fuga

Pateticamente presos dentro de máquinas financiadas em sessenta prestações

Sorri com ironia quando o senhor da bicicleta ultrapassou o carro importado

A parede feia com rabiscos primitivos

Remeteu as cavernas

Ah! O inútil desejo humano de deixar seus vestígios

No fundo uma estúpida vontade de ser onipresente e imortal

Exalei o odor podre do rio fétido

Ao mesmo tempo em que li a placa mentirosa que vendia a ilusão da despoluição

Mais um pretexto para desviar dinheiro público pra conta de algum figurão

O mesmo depravado que fez da cidade a privada de sua empresa particular

O vento frio da noite de inverno

Corta como faca

A mesma usada pelo dependente que assalta a senhora com a bolsa de grife

No viaduto a fumaça branca do cachimbo harmoniza com a fumaça dos veículos

Não sou eu, porém, mais uma vez sou vencido pelo vício