Não Escreva Seu Nome na Areia Movediça

Escrevi na areia nossos nomes.

Passei anos fazendo isso.

Escrevi os meus sorrisos

e os motivos

De minha plenitude.

Apesar dos avisos

E de toda minha quietude,

Parei pra descansar e o vento magoou.

Espalhou os grãos no espaço

E a areia me apagou.

Desmanchei

Como quando a luz se desfoca

E cada vez menos me toca.

Deixando minha sombra fugir do meu palco.

Estou sim desmanchando...

Sinto meu nome virando uma lenda.

Cada pronúncia virará reprimenda

As sílabas se perderão no tempo

Tentando achar a saída

No meio das cortinas e gargalhadas.

Mas como poderia saber, apesar de toda premissa,

Que minha areia confortante

Era areia movediça?

Hoje, sou estátua deformada de gesso

cada vez mais soterrada pela areia

De uma ampulheta inexistente.

A areia continua caindo

E tomando conta dos meus espaços.

Do modo mais inconsciente.

Vê?

Ela me apaga mais todo dia

Sempre que eu penso em reacender.

Mas não pode ser assim!

Não pode!

Junto comigo vejo outros impérios se desabarem.

Castelinhos de areia e seus habitantes,

Circos, cinemas, teatros,

Tudo que já fora vivo antes!

Os palhaços estão desamparados,

Bêbados ao meio-fio,

O rosto coloridamente borrado

E ainda deles, gargalha o frio.

Parece que tudo pelo qual se foi feliz

Tudo que se quis

Era trivial, falso e fugaz!

Acabaram-se todos os risos no primeiro "eu preciso",

Acabarem-se como cessavam os aplausos ao fim do improviso.

E só me resta perguntar, sufocado por saudade

Nesse desmoronamento impiedoso em que me encontro,

Onde é que fica a verdade?

Tanto se fala em verdade, que na primeira circunstância

O presente se mostra fumaça

E o perto se transforma em distância.

Se esquece, se atira ao lixo

Cada segundo que foi vivido.

Não existe mais verdade!

Onde fica a verdade?

Fui.

É. Fui.

Fim.

Aqui eu fui, aqui eu era

Só me resta o dom da recordação.

Escrevi na areia meu nome

Que significa decepção.

Mas parei só pra descansar

E agora virei ilusão.

Eis o poema do desmoronar

Eis o poema do não existir

Desvanecer é palavra tão bela

Que não mereceria nem estar aqui.