Descansem o meu leito solitário
Na floresta dos homens esquecida,
À sombra de uma cruz! E escrevam nela:
— Foi poeta, sonhou e amou na vida. —
Álvares de Azevedo
Malfadado ao poento solo que pisei
Cuja vida insossa de lodosos amores
Os quais enfunam degenerados senhores
Encheu-me do tédio que no peito levei
Embora nos sonhos beatas donzelas
A vida inspirou-me a fluir como velas
Não chores princesa ao ver-me partir
Pois vou, vou feliz ao eterno dormir
Ansiei perene sono em minh’alma
Realizo então o alcançar dessa graça
Transformai esse lamento em calma
Visto que o sofrer do poeta já passa
Notai o quão íngreme soa às pessoas
Assimilar doce morte a calmas lagoas
Cuja paz transborda no leito aquoso
O fluir langoroso dos cristais reluzentes
O estribilho de acordes no véu caloroso
Soterrado no solo quais brandas sementes
Mas ao poeta que vis refrães vos goteja
Por antítese ao burgo que o maneja
Não se acobardou do descanso do hades
Nem sentiu em su’alma o vão acúmulo
Por zombar dessas juras do além-túmulo
Não o temeu na vida como os covardes
Pois se há na terra certeira esperança
Façamos com ela infindável aliança
Se haverá termo às desgraças humanas
Enquanto houver a débil raça pensante
Não será por insanos sonhos de Joanas
Nem pela divindade hilariante
Mas tão somente dum modo esvaecerá
A agonia que no espírito arderá
Aflições e reveses derreterão
Quando n’alma dos homens uma luz brilhar
E a clarividência os fizer declarar
O alívio e frescor que na morte sentirão
Maio de 2009