MORTE
Detona-me, oh morte!
Sê meu refúgio sereno
Desta minha vida de má sorte
Só rancor e lamento
Toma meu corpo acabado
Destroçado pela angústia fúnebre
Que o tempo desalmado
Reparte de dores e lhe sucumbe
Devora meus anseios
Imprestáveis enquanto em vida
Barrados sempre aos atropelos
Da podridão das armadilhas
Vem morte, sê meu consolo
Abra-me o túmulo florido
De cravos sangrentos chochos
Acaba-te com este martírio
Dilacera meu corpo sem dó
Siga em frente! Esquarteja-o
Faça com que nem reste um resquício de seu pó
Nem em lembranças deixe-o
Destrua delicada meu amor esquecido
Cubra-me com sua treva vicejante
Desejo ser o triste canto enaltecido
Ao templo maldito tremulante
Defunto sou ao pé da árvore seca
O pranto intermitente que desce do sereno
Versos fragmentados de endechas
Sou a bruma que paira o esquecimento
O que a vida me apregoa
O que a vida me ignora
A morte vem e me coroa
Sem que minh’alma apavore
Vivo penando ao suplício
Prostrado ao aborrecimento humano
Lacrimejando o horror de um bravio
Maculado de um sentimento tirano
Vôo à imensidão da noite
Sou corvo solitário escondido
Afugento-me desta vida de açoite
Da morte agora sou amigo
E há mais uma estrofe do meu pranto
Do meu funeral assombrado
Sou feliz com a morte arrancando
Toda tristeza desta minha vida de marginalizado