Separação

E então vejo que ela se foi.

Sinto-lhe, ainda, o perfume,

que não se renovará.

Como sempre tão delicada ...

tanto me alertava para sua partida ...

- olha, benzinho, talvez uma mulher mais próxima...

- Não saia de sua rotina, não ...

E eu, meu Deus, abriguei-me na tolice

de não ouvir o que ela me disse.

Como a morte, Vinicius*,

o adeus chegou-me pelo telefone.

Punhal inacreditável.

Punhal doloroso,

que me rasga peito e alma

e me devolve para o horror

que mistura solidão, angústia e dor.

Por tudo que já passei

não me assalta a ira.

E até agradeço, entre um e outro choro,

os inúteis gestos de consolo.

E até retribuo com um automático "estou bem",

sem sequer saber a quem.

Continua-me a certeza

que só ela amei.

E essa tanta tristeza,

que só eu sei...

As horas da noite já não me trazem sua voz.

Vôos atrasados, não mais. Só esse silêncio atroz.

Mas ainda sinto o seu corpo

e bebo de sua alma.

E vivo essa saudade

que nada acalma.

Essa agonia de saber,

que junto a ela,

foi-se meu motivo de viver.

Mas não penso, filho, em suicídio.

Pois de morte já tenho o bastante.

Em tantas outras vezes

vi o meu chão se abrir

e só por teimosia continuei a ir.

Mas, talvez agora, aquele excesso de seguir

impeça-me outra caminhada

e acentue esse gosto do nada.

*da poética de Vinicius de Morais.