Necrolatria

I

Trago um grande ataúde no peito

E súplicas vãs de agonia lancinante.

Deus, talvez, sente por mim despeito!

Por isso senti-me distante

Da Cura que tanto almejei

Durante os anos de minha infância

E da adolescência que não aproveitei;

Nem mesmo nos momentos de ânsia!

Infectado por algum tipo de magia,

Procurei uma luz sobrenatural

Que poderia luzir preponderante sobre a orgia

Dessa minha Tortura sepulcral.

Só que um torvo lampejo esverdeado

– Como aquele que surge na consciência

Do indivíduo quase enforcado –

Foi o único resultado que obtive nessa “transcendência”.

Explicitamente misantropo e lôbrego!

Assim sobrevivo de forma misteriosa,

Mesmo me sentindo sôfrego

Pela libertação dessa vida tediosa.

Há um vácuo sem fronteiras

Formado nas galerias dos meus conflitos...

Vejo os fantasmas e as caveiras

De todos os fenecidos poetas aflitos.

II

O arcano sonho da juventude

Envelhecida, mantém-se ocultado

Da vida( que foi um pesadelo mascarado!)

Cheia de dissabores e inquietude.

Tenho um coração inexistente

– Incriável até ao Deus mais perspicaz!

Então como sinto um martírio assaz

Assim, serei eu um espírito convalescente?!

Sou tão inorgânico quanto

As matérias mortas do mundo.

Mas lá no fundo,

Existe sangue, pranto,

Bactérias e bolores...

Provavelmente que eu esteja tão deletério

Como os decompostos cadáveres do cemitério

Ou aos meus putrescentes amores.

No famoso labirinto mítico

(Aquele do Monstro da Morte),

Descobri resquícios – por sorte –

Dum velho ritual, escondido no mefítico

Piso infestado de ossada animal.

E numa misteriosa necrolatria

Invoquei a Esquife mais fria

Como sendo minha Morada Final!

(2007)