Meu tempo se foi
O mundo lá fora se esconde
Retrai-se em lamento
Da imensidão desmedida da dor
As gotas da quente chuva não caem mais
A secura dos galhos mortos de frio não nos diz nada
O silêncio sobre as pedras e casas
Reflete o vazio dentro dos corpos
E nós caminhamos sem nada
E nós observamos sem vida o tempo que passa
Há algo errado. Algo do qual fugimos
Pela escuridão de mundos sem alívio
Luzes passam em barulhos
Ruídos de tosse rasgam o ar
O mundo em volta de nós está morto
Será que ninguém viu ele morrer?
Será que ninguém viu o sol se pôr?
Será que ninguém notou o tempo passar?
A poeira se espalha em montanhas a perder de vista
Negra fuligem da cidade dos mortos
A maneira como enxergo os dias não serve
A cegueira comum contamina meus olhos
Eu enxergo através de grades corroídas
Pedaços de vida em falhas me abraçam
Pedaços de sorrisos em pixels me consolam
A mudez gelada das horas apenas olha
A pressa de chegar em lugar nenhum
O desespero arfante de construir novas ilusões de vidro e papel
O mundo se retrai em seu último dia de sol
A guerra consome silenciosamente os sorrisos
A infância suicida-se em um golpe de desapontamento
Nada mais é como antes, nos tempos do perene verão.
A inesgotável mudança da vida sopra contra os sonhos fracos
E nos leva ao escuro por estradas e fachadas falsas
Nos leva para dentro de nossa própria mente insegura
E por entre as lembranças queimadas vemos na fumaça
Rastros de uma imensidão eterna e vazia
Um pedaço do futuro sem fim
Um futuro que nos espera sem alma
Num último segundo de lucidez infantil
O sorriso se despedaça diante do sangue que brota da realidade
E a cidade se verticaliza na névoa da dor
Meus olhos se fecham ao saber que o futuro era mentira
Meu tempo se foi, assim como a velha e simples felicidade.
Nada mais é como era antes.
A vida se esconde, definha, e parte em silêncio sem mim.