Matéria

O maquinal espetáculo férreo

das artérias de Minas

amputou meu crânio

no desapego das montanhas.

Pedras azuis, básicas entranças,

cérebro liquidificado.

Os trilhos rangem,

meus dentes medalhinhas

de santos.

Beatitude dos mineiros,

antigas modas

de oratórios e confissões.

Ânsia do domingo parado,

a praça de arvoredos fustigados.

Tenho a alma confundida

no silêncio das Gerais.

Minha amante hoje é crente,

meus amigos são saudades,

meu cálice não contém dores,

meu rancor não se fez em prantos.

A matéria é a jabuticaba espocada,

os pés no patíbulo,

o grito de misericórdia,

o plano de conjuras.

Quimeras minguadas,

o ouro ainda no centro

e importância sem.

Saias rodadas no baú,

bandeirinhas de junho,

broinha de amendoim,

mãe mocinha no retrato.

Meia volta,

volta e meia

não vamos mais dar.

A canção acabou.

A matéria está na estrela d’alva,

no horizonte ainda ontem,

no poema pueril,

na naftalina do armário,

no café com leite na varanda de trás

e só.