Marcas de vivência (Para Holden Caulfield)
Traços, linhas
E cores perfeitas
Enfeitam o mundo
Que passamos a ver
A cada estação que passa
Com olhos diferentes.
Permanece este retrato
Como a veracidade
Do que não somos
Sequer capazes de
Juntar as peças
E saber distinguir
Saudade de loucura.
Desilusão como
Nossa preferida forma
De arte a qual
Pintamos, escrevemos
E encenamos para recriar
O que veio a se tornar
Intocável e irreplicável
(Talvez para o bem).
Impulsionamo-nos a apagar
Qualquer lembrete de que
Estamos lucidamente
Vivendo contra nossa vontade
Os parágrafos e fragmentos
De um desgovernado
E imparável presente.
Digo-lhe que esta é
Uma das razões a qual
Me atento a observar
Cada minúscula coisa
Que esteja fora
De seu devido lugar.
Pois será tarde demais
Quando enfim notarmos
Que o dano é irreversível,
E nada será possível
De compreensão quando
Passarmos a encarar
Tudo de ponta cabeça e
Em anagramas embaralhados.
Mas sabemos que
Ainda é muito cedo
Para deixarmos
Os ontens serem
Nada além de
Vagas memórias
À beira do oblívio.
Porque ainda é como se
O perfume, o sabor,
As melodias e as vozes
Não fossem capazes
De desapegar de nós
De uma vez por todas.
Então guardamos isto
Em carinhoso sigilo
Com a esperança de que
Algum próximo amanhã
Seja exatamente igual
Ao que tudo era a
Incontáveis anos atrás.
Em esperança de que
Talvez um dia
Seja concebível ter
De volta as velhas
E familiares presenças
Que escaparam
Inesperadamente de nós
Num deslize fatídico.
Distantes, permanecemos
Apanhando as coisas
Que possuam a capacidade
De nos fazer minimamente
Contentar e aceitar
Com os termos do agora.
Mas nossos olhos
Sempre se virarão
A se fixarem ao
Que está bem atrás
De todo o caminho
Percorrido.
Pois estas marcas de vivência
São cicatrizes eternamente
Abertas e ardentes
Que sobre hipótese alguma
Escolheríamos curar,
Mas apenas com o tempo
Talvez aprenderemos que há
Muito além nelas
Que um simples amor iludido.