O retrato

Me pediram para escrever uma homenagem,

Mas não é fácil escrever...

Até porque deste alguém,

Guardo doce imagem,

Que minha vida sempre marcará.

É tão complicado devido a saudade...

Por isso maldigo o tempo...

Maldigo sua inevitável passagem...

Nessas horas, a lembrança é doce aragem,

Que a dor faz refrescar...

Minha avó era uma mulher forte...

Senhora do vento norte

(como neta, sou vento sul, mas deixe estar).

Lembro de seus cabelos branquinhos,

Dos seus olhos vivos,

Do seu carinho...

Mas não no passado...

Quero um retrato pintar.

Senhora,

Matriarca,

Antepassada...

Dama pelo tempo curvada,

Mas que dominava as agulhas,

Costurando com mãos de fada.

Observava a tudo e a todos,

Enquanto tomava mate,

À beira do fogão a lenha...

Proseando, com sua fala serena,

Que me lembro,

Como se ainda fosse pequena,

Entre um cerzir e um casear.

Mulher corajosa,

Que sustentava a família

E não temia dos outros a fala.

Andava por onde queria

Em épocas que mulher alguma o faria.

Mulher a frente de seu tempo,

A caminhar...

Mas o que penso?

É incompleto ainda o retrato!

Ainda não pintei nem a metade

E a minha paleta com tintas,

Está em minha mão, a secar...

Tento fazer juz a sua expressão bondosa,

Aos dedos curvados pela lida e pela idade,

Seu sorriso sincero...

E percebo que o retrato

Torna-se cada vez mais difícil de pintar.

Por isso,

Troco as tintas pelas palavras,

E faço um retrato escrito nas linhas,

Que irão se desenrolar...

Chamada Zilda Sallaberry Ribeiro,

Mulher do campo,

Costureira,

Mãe de dois filhos,

Esposa fiel...

Apesar de ser forte como rocha,

Não escondia o mel,

Que havia em seu olhar.

Mas,

Por mais que eu tente,

Mesmo em meu poetar paciente,

O retrato é incompleto...

Lágrimas rolam...

E as palavras faltam,

Para minha avó,

Esta grande pequena mulher, celebrar.

É quando eu ouço o vento,

Roçando nas orelhas

Trazendo a risadinha

E a voz da "Zizi" a sussurrar:

"Olha no espelho, neta minha...

Se queres ver meu retrato,

Basta nele te olhar".

É então que eu finalmente entendo...

Ela nunca se foi.

Está viva em mim...

E sendo assim,

Que melhor retrato exisitiria,

Do que aquele que ela, minha avó, ajudou a criar?

Zannah
Enviado por Zannah em 04/10/2008
Código do texto: T1211407
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