A Poesia e as Horas
A poesia tem a cor da hora em que é feita,
mas não da hora que o relógio marca
e sim, da hora interior
que está na cabeça do escritor.
Se a poesia é matinal,
fala de flores, juventude, sol
de coisas que chegam a bom final
como sói acontecer num arrebol.
Se é vespertina,
traz nas palavras o cair da tarde,
com adjetivos se esgueirando
entre a penumbra dos versos
de um sol que já não arde
para iluminar substantivos
que entre os pronomes mais diversos
ainda continuam ativos.
Se a poesia é noturna e há luar
as palavras são fáceis de encontrar
e juntas fazem uma serenata
à folha de papel que as acata
e as transforma em poema
valorizando o encontro do tema
que o poeta elegeu.
Mas se a noite é escura como breu,
é difícil encontrar porto seguro
para cada linha da poesia.
Ela tateia a trilha que perdeu
para encontrar a frase mais correta
que a conduza à mente do poeta
e o lembre mesmo até do que esqueceu.
Agora, se lá fora é madrugada,
há de ter vulto da mulher amada
em cada pensamento que é escrito,
ou para agradecer por tanto amor
ou para lamentar o fim, e a dor
que só mesmo a poesia então acalma
porque se o transe do corpo é infinito
a paz só vai se achar dentro da alma.
É assim a hora da poesia
que dura muito mais que o nosso dia
e mais que as horas no relógio dão.
Porque no verso o tempo está marcado
no corpo de quem, predestinado,
arranca as rimas do seu coração